Raina Penquer

                                                         Alira e Kian          

​

          Há muito tempo, quase no limite da memória dos homens, em Samarcanda, vivia Alira, uma bela sereia das águas cristalinas do rio Zarafshan, e Kian, um guardião das florestas ancestrais. Seus mundos eram separados por barreiras invisíveis, mas seus corações batiam em uníssono desde o primeiro encontro à beira do rio.

          Alira, com sua voz melodiosa, encantava os peixes e as flores aquáticas, enquanto Kian, forte e sereno, protegia cada árvore e cada criatura da floresta. Um dia, atraído pela canção de Alira, Kian aventurou-se até as margens do rio, onde as águas se encontravam com a terra. Seus olhos se encontraram, e uma conexão profunda surgiu, desafiando as leis da natureza.

Porém, o amor entre uma sereia e um guardião era visto como impossível. As diferenças entre seus mundos geravam conflitos e desafios constantes. Alira sentia-se dividida entre o desejo de estar com Kian e a obrigação de proteger seu reino aquático. Kian, por sua vez, lutava para conciliar seu amor com a responsabilidade de sua missão na floresta.

          Com o passar dos anos, ambos perceberam que a verdadeira transformação precisava vir de dentro. Alira aprendeu a compreender a importância das árvores para manter o equilíbrio das águas, enquanto Kian começou a valorizar a harmonia das correntes que sustentavam a vida no rio. Essa mudança de comportamento permitiu que eles encontrassem um terreno comum, onde seus mundos podiam coexistir em paz.

          Juntos, Alira e Kian criaram uma ponte mágica entre a água e a terra, simbolizando a união de suas espécies e a força do amor que os unia. As águas do Zarafshan começaram a fluir mais livres, e a floresta floresceu com uma nova vitalidade, refletindo a felicidade que ambos haviam encontrado.

          Essa história, há muito esquecida, é murmurada ainda pela brisa, nas tardes frias e neblinosas de Samarcanda, por entre troncos antigos de antigas árvores, mas só pode ser ouvida pelos resilientes e os enamorados. Mas é um murmúrio quase imperceptível que logo se esvai na neblina fria.